quarta-feira, 29 de junho de 2011

Enfim

Morre uma estrela pop de terceira categoria e dá-se-lhe mais tempo de antena nos média do que aos assuntos que realmente interessam ao funcionamento do país ou do que a pessoas que trabalharam toda a vida para o público. Depois admiram-se que não já existe Ministério da Cultura, como diria o outro "ripa na rapaqueca, é disto do que o meu povo gosta!".

Previsão: vai demorar apenas uma semana a ter disco de ouro (também o nº de vendas para lá chegar é mínimo), e vai ser o disco mais vendido do verão e do ano.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603)

1 – Breves Referências Introdutórias à Obra

O texto em causa chegou até os nossos dias através de dois manuscritos anónimos, um existente na Biblioteca Nacional e o segundo no Arquivo da Cada do Cadaval[1]. O primeiro dos quais foi escrito por um secretário que se baseou nos apontamentos do autor, com este a fazer alguns acrescentos e rectificações[2], especialmente nomes de pessoas e de localidades, controlando assim a produção do texto. O segundo exemplar é uma cópia, tosca e cheia de erros de transcrição, do primeiro.
A crónica, dedicada ao filho mais velho do autor, Aires de Saldanha[3], era antes da publicação da fonte numa edição critica e anotada um texto sem título[4].

2 - Papel do Historiador

Passando para a análise do papel de historiador, temos de ter em consideração que António Saldanha, não sendo um cronista profissional, casos de Gomes Eanes de Zurara e de Fernão Lopes, que tinham como uma das suas principais actividades a produção de história, entra numa categoria de cronista por gosto próprio. Durante a sua estada em Marrocos, o autor registou, provavelmente, numa espécie de diário os acontecimentos[5] políticos que considerou mais importantes do reino magrebino, ocupando depois algum do seu tempo no final de vida a tratar da passagem do texto escrito para a fonte em análise, isto porque “o pensamento deste papel olha a maiores fins”[6]. Fins estes ligados a “lembranças bem recebidas de ministros superiores” que o “obrigaram a escrever”[7], ou seja, o interesse informativo para os conjurados sobre o estado geopolítico de Marrocos levou a este esforço literário por parte de António de Saldanha. Mediante isto podemos chegar à conclusão que o autor não estava limitado pelo círculo dos conjurados na sua produção desta obra, como os cronistas geralmente estão pelo seu empregador.

Na sua introdução António Saldanha afirma que tem por “fim principal a verdade”[8], quando se refere a ter de inserir na sua obra breves referências à batalha de Alcácer-Quibir e aos seus momentos imediatamente subsequentes, contendo esta curta introdução informações que podiam esbarrar com o que outros autores afirmavam.
Acreditamos que a verdade fosse um aspecto que prezasse, já que afirma a “lembrança dos bons e maus sucessos por que passou cada homem no curso de sua vida”[9]. Esta citação torna-se compreensível no contexto reflexivo em que se insere, pois é provavelmente resultante da auto-análise por parte deste experiente indivíduo, no inverno da sua existência, da vida humana como composta de duas peças indissociáveis, os aspectos positivos e negativos, que no fim de contas formam o total, a verdade.

O autor tem a noção que deixa um registo para a posterioridade, umas memórias, mas não parece que tenha tido alguma pretensão de elaborar uma obra historiográfica propriamente dita. Com a sua experiência de vida constata que grandes feitos ficaram por contar por morte dos seus obreiros e que a dedicação de outros ao registo de tais tarefas preserva o exemplo a seguir, independentemente da função e estatuto do individuo[10]. A preocupação em preservar os bons feitos insere-se numa linha mestre do trabalho de historiador, mas não é, na nossa opinião, suficiente para afirmar que houvesse uma consciência do desempenhar deste papel.


[1] Cf. idem, ibidem, p.XCVII.
[2] Cf. idem, ibidem, p.XI.
[3] Como é apreciável em “E porque, Aires de Saldanha, desejei pôr-vos esta lembrança diante dos olhos (…) Quis fazer-vos esta memória” (António de Saldanha, Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603), estudo crítico, introdução e notas por António Dias Farinha, trad. francesa por Léon Bourdon, Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica Tropical, 1997, Introdução do Autor, p.3.)
[4] Cf. Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, ob.cit., p.XI.
[5] Cf. idem, ibidem, p.XI.
[6] Cf. António de Saldanha, Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603), estudo crítico, introdução e notas por António Dias Farinha, trad. francesa por Léon Bourdon , Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica Tropical, 1997, Introdução do Autor, p.3
[7] Cf. idem, ibidem,p.3.
[8] Cf. idem, ibidem,p.5.
[9] Cf. idem, ibidem,p.3.
[10] Aspectos constatáveis na seguinte afirmação: “E como não é a todos concedido que (…) cheguem jubilados a os poderem contar nos seus lares e se acabem as vidas tam limitadas em seus naufrágios ficam os sucessos delas, ainda que digno de memória pêra exemplo, sepultados com seus donos. E parece que com este temor tomaram grandes homens a pena na mão pêra contarem não só o que lhe aconteceu em suas maiores cousas, mas também a rezão delas, uns como grandes administradores das facções, outros como companheiros nas alheas.” (António de Saldanha, Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603), estudo crítico, introdução e notas por António Dias Farinha, trad. francesa por Léon Bourdon , Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica Tropical, 1997, Introdução do Autor, p.3)

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Média: Comunicação e Omissão

Germaine Greer, académica e autora feminista, querendo chamar a atenção do grande público, para a destruição desta espécie vegetal por parte do melhor amigo do homem, [isto mais por culpa do dito animal bípede e "racional" e ao recurso a passeios por "bosques" (woodlands) onde habita a plantinha em questão] decidiu terminar um discurso em beleza, dizendo uma daquelas frases choque, marcantes que ou suscitam asco ou levam a pessoa a questionar-se sobre o que foi dito (se não, ao menos o porquê da frase-choque), típicas de quem é apologista do "chocar para marcar pontos", do qual eu sinto um fraquinho.

Em suma, ela disse "If you love your bluebells kill your dog". Problema - quase ninguém reproduziu se quer uma parcela do que foi dito pela senhora ou sequer uma ideia geral do que foi discutido, "todos" nos média centraram-se na última frase. Um floreado argumentado mais ornamentado? "Não, a mulher é louca" gritaram uns histericamente ao ler os tabloids, enquanto outros sussurram aos colegas, com tom jocoso, no local de trabalho, enquanto fingiam laborar com o chefe distraído com a esbelta e esguia figura da secretária do Sr engenheiro, aquele do terceiro piso, que entornou o café, prepositadamente, no atraente (mas gay, sem que muitos o saibam) rapaz dos cafés, que mantém uma relação estável com um quarentão casado com três filhos, que até gosta de animais e que se preocupa minimamente com o ambiente para tentar alterar o roteiro de passeio do cão (soa mal não soa?) quando acha esquisito que dos primeiros 43 resultados do google todos digam o mesmo e pouco ou nada se saiba sobre o contexto do dinamite verbal da "senhora-que-não-gosta-de-cães". Como tal, o Senhor do armário decide pesquisar um pouco mais e descobre que afinal o facto descrito não entra para a contabilidade estatística dos acontecimentos que necessariamente precediam a segunda vinda de Cristo, podendo voltar a sua vida o mais normal possível.

"If it bleads, it leads", se é referente a sangue, sexo, tragédia (de qualquer tipo) ou seja chocante, salta da trincheira das not-icias  para a terra de ninguém e ali falece sem que ninguém se lembre sobre o que era ... é mais uma vitima da omissão jornalística.

"Don't question authority -Question everything (...) Don't just question authority -Don't forget to question me" Jello Biafra

Dio Ti Ama

Scully: I'm afraid that God is speaking and no one is listening. 

The X-Files: All Souls (#5.17) (1998)

domingo, 19 de junho de 2011

António de Saldanha

António de Saldanha nasceu depois do ano de 1570[1], no ceio de uma família nobre “muito influente da época”[2], os Saldanha de Albuquerque[3], não se sabendo em que localidade.
António de Saldanha era filho morgado de D. Joana de Albuquerque e de Aires de Saldanha[4], homem que viveu grande parte da sua vida na Índia, ocupando os cargos de capitão-mor no Mar Vermelho, de capitão de Sofala e de Vice-rei, entre 1600 e 1605[5]. Além desta espantosa carreira no Oriente, Aires de Saldanha foi capitão de Tânger, entre 1591 e 1599[6], sendo que, a 17 de Outubro de 1592, o nosso autor, que se encontrava nesta praça portuguesa do norte de África, como fronteiro, é feito prisioneiro numa entrada na terra dos mouros[7].

O cativeiro de António de Saldanha foi prolongado, durou até 1606[8], e durante este período houve várias tentativas de resgate pelo seu pai, que chegou a reunir, várias vezes, a quantia monetária requerida, sem que dai surtisse algum efeito[9].
Durante em período de catorze anos, este nobre viveu em Marraquexe, a capital política do Sultão de Marrocos[10]. Devido ao seu estatuto social, o nosso autor foi tratado com grandes privilégios, como: a possibilidade de receber de forma regular correio, a total liberdade de movimentos dentro de Marraquexe, a posse de criados, e a possibilidade de pedido e concessão de empréstimos[11].
À volta de António de Saldanha orbitavam muitos cativos de origem portuguesa, que tinham altos cargos na administração e no exército do sultão[12]. A interacção destes com este nobre devia-se à partilha da “nostalgia da pátria”, do sentimento de “fidelidade às origens”, do “desejo de regressar a Portugal”, e como modo de obter testemunhas da falsa conversão ao Islão, úteis, mais tarde, durante os processos da Inquisição[13].
Só com a intervenção de Anthony Sherley, aventureiro inglês ao serviço dos espanhóis, é que o nosso autor é resgatado de um país que estava lançado no caos administrativo, depois da morte do Sultão em 1603.

Após a sua chegada a Portugal, António de Saldanha casou com D. Joana da Silva, tendo com ela três filhos e uma filha[14], e foi viver para o morgadio instituído pelos seus pais, no solar da Junqueira[15]. Em 1607 tornou-se comendador de São Salvador de Sarrazes na Ordem de Cristo, e ocupou os cargos de Alcaide-Mor de Vila Real e de Capitão-Mor da Naus da índia, em 1633[16].

Mas a sua história não acaba aqui. António de Saldanha foi ainda um “destacado conjurado da Revolução de 1640”[17], isto apesar de ter mais de sessenta anos nessa data[18]. Da preparação da revolta ao acto em si, parece que o nosso autor foi bastante activo. Participou na aclamação do rei[19], escoltou membros do governo espanhol deposto ao castelo de São Jorge[20], prendeu conspiradores de um contra-golpe castelhano[21], foi, enquanto general da Armada, encarregado de subjugar a resistência espanhola na ilha Terceira[22], foi governador da Torre de Belém[23] e participou no Conselho de Guerra de D. João IV[24].
António de Saldanha morre no ano de 1656, antes do dia 20 de Março[25].


[1] Não se sabe a data exacta, tem-se apenas esta referência pois o seu pai regressa, da Índia, a Portugal para se casar nesse ano, isto segundo “Saldanha (Aires)”, in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XXVI Rodri - Sanch, Lisboa/ Rio de Janeiro, Editorial Enciclopédia, [s.d.], pp.696.
[2] Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, in António de Saldanha, Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603), estudo crítico, introdução e notas por António Dias Farinha, trad. francesa por Léon Bourdon , Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica Tropical, 1997, p.XXVII. Além de influentes, os seus pais são um bom exemplo da obtenção de enormes riquezas no ultramar, que consequentemente foram usadas para a constituição de um morgadio em 1600.
[3] Cf. Joaquim Romero Magalhães, “A sociedade”, in História de Portugal, Direcção de José Mattoso, Coordenação de Volume por Joaquim Romero Magalhães, Vol. III, [Lisboa], Circulo de Leitores, 1993, p.489.
[4] Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, ob. cit., p.XXXIII.
[5] Cf. “Saldanha (Aires)”, in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XXVI Rodri - Sanch, Lisboa/ Rio de Janeiro, Editorial Enciclopédia, [s.d.], pp.696.
[6] Cf. António Dias Farinha, “Notas ao Texto da Crónica de Almançor ”, in António de Saldanha, Crónica de Almançor, Sultão de Marrocos (1578-1603), estudo crítico, introdução e notas por António Dias Farinha, trad. francesa por Léon Bourdon , Lisboa, Instituto de Investigação Cientifica Tropical, 1997, p.505.
[7] Cf. idem, ibidem, p.505.
[8] Por este motivo aparece nos registos dos Nobiliárquicos com o epíteto de “O Cativo”.
[9] Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, ob.cit., pp.XXI. A recusa na entrega deste fidalgo é explicável pelo reconhecimento, por parte do Sultão, do seu alto valor na resolução de possíveis problemas nas relações com a monarquia dual ibérica.
[10] De seu nome Mawlây Ahmad al-Mansûr, vulgarmente chamado de Almançor, é conhecido como um importante obreiro do período áureo de Marrocos no fim do século XVI.
[11] Cf. idem, ibidem, pp.XII-XIII.
[12] Cf. idem, ibidem, p.XIII. Os chamados elches, que na sua maioria tinham aderido ao Islão pelo melhor tratamento que dai advinha.
[13] Cf. idem, ibidem, p.XXVII e XXIX.
[14] Aires de Saldanha, Bernardo de Saldanha, João de Saldanha e D. Margarida de Vilhena. Antes de casar tivera um filho natural, que depois de legitimado usou o nome de António de Saldanha.
[15] Cf. idem, ibidem, p.XXXIII.
[16] Cf. Manuel Freire Themudo Barata, Travessa dos Conjurados, Disponível em http://www.ship.pt/
pdf/travessa.pdf, [Ficheiro capturado a 15/03/2007].
[17] Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, ob. cit., p.XIII.
[18] Cf. idem, ibidem, p.XXII.
[19] Cf. Luís de Meneses; 3º Conde da Ericeira, História de Portugal Restaurado, nova edição anotada e prefaciada por António Álvaro Dória, Vol. I, Porto, Livraria Civilização, 1945, p.528. O seu filho, Aires de Saldanha, também participou nesta aclamação e foi membro activo do movimento de restauração, falecendo em combate na Batalha do Montijo em 1644.
[20] Cf. Leonor Freire Costa e Mafalda Soares da Cunha, D. João IV, Lisboa, Circulo dos Leitores, 2006, p.31.
[21] Cf. idem, ibidem, p.115.
[22] Cf. “Saldanha (António) ”, in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XXVI Rodri - Sanch, Lisboa/ Rio de Janeiro, Editorial Enciclopédia, [s.d.], pp.697.
[23] Cf. Manuel Freire Themudo Barata, ob.cit..
[24] Cf. Leonor Freire Costa e (…), ob.cit., p.148.
[25] Cf. António Dias Farinha, “Introdução”, ob. cit., p.XXXIX.

engrish IIII


O conhecimento do erro

Rodou calmamente a velha cadeira para a janela, que parecia planar sobre o rio, e mordeu os lábios enquanto ouvia os desaforos de um exemplo de juventude mal medrada. Quando este se calou, um breve momento apenas bastou para que os seus secos lábios proferissem uma simples e cortante realidade, "Na história da minha vida, nem és digno de seres mencionado nas notas de rodapé"

sábado, 18 de junho de 2011

Civilização (e falsidade também rimam!?)

"As mais belas civilizações tiveram um rápido declínio, exactamente porque elas foram demasiado longe na dissimulação." Agustina Bessa-Luís

 (gostei da imagem e da simplicidade nela patente)

Civilização (e depressão rimam!)

"... quando uma civilização se preocupa excessivamente com a aparência e a apreciação glamorosa dos objectos e pessoas, essa mesma civilização estará prestes a dar um passo em falso no vazio."

É muito mau ...

... quando a tua obra gastronómica tem uma textura em tudo semelhante a vómito de gato.